Paula Pinto Almeida / Filhos  / Aparelhos Digitais: Quando se Ativam Relações?
dispositivos digitais

Aparelhos Digitais: Quando se Ativam Relações?

Vivemos num mundo onde aparelhos digitais se encontram amplamente difundidos e fazem parte das rotinas diárias de qualquer família. Praticamente tudo se pode fazer através de um smartphone ou de um tablet.

Ao chegar a casa queremos descansar um pouco e eles querem relaxar. Resultado, cada um vai para o aparelho eletrónico mais próximo! Isso não é pouco comum por algum motivo. A sociedade está a caminhar neste trilho.

Quase todos os processos infantojuvenis ou parentais que acompanhei nos últimos tempos tocam a questão da tecnologia. Os pais sentem dificuldade em regular o tempo que os filhos passam nos dispositivos (e o tempo que eles mesmos passam nos dispositivos). Os miúdos não querem sair da frente dos dispositivos… e os pais também não.

E agora?

Aparelhos Digitais em Sala de Aula

Há dias aconteceu numa das minhas idas a uma escola, uma menina levou um tablet para a sala. Quando eu entrei na sala ela veio entusiasmada mostrar-me o tablet e todas as suas funcionalidades. Os colegas entusiasmados queriam ver e mexer no tablet dela. E quando lhe perguntei se podia guardar o tablet porque íamos começar a sessão, disse-me que não.

Observando assim, o que é que tem mais valor?

  • O entusiasmo da criança que leva uma novidade (cor de rosa com decorações glitter) que na sua excitação quer mostrar e partilhar o seu brinquedo novo.
  • A necessidade dos colegas de satisfazerem a sua curiosidade e de se divertirem com uma novidade.
  • A minha necessidade de iniciar a sessão com ela e com os colegas.
  • A necessidade dos pais, que poderá passar por proporcionar o entretenimento da filha, facilitar o desenvolvimento de habilidades da menina, facilitar as suas rotinas diárias de pais mantendo-a ocupada… entre outras.
  • A necessidade da escola, que acredito ser semelhante à minha.

Para mim, as necessidades de todos são válidas e igualmente valiosas.

O que é que pode organizar esta igualdade?

A liderança. As crianças têm necessidades e nós também. E, são igualmente valiosas.

Nós adultos somos os líderes das relações e, acima de tudo, precisamos de assumir esse papel. Neste contexto, e para o exercer estar munido de informações válidas é para mim fundamental.

Dessa forma, um estudo realizado a Unidades de Saúde Familiar (USF) da zona norte de Portugal sobre a “Utilização dos aparelhos digitais em crianças com idade entre os 12 meses e os 5 anos” em 2020, concluiu que o uso dos dispositivos eletrónicos é mais frequente nas seguintes alturas: refeições, entretenimento, pré-sono, birra e como prémio.

aparelhos-digitais

Sabe-se de antemão  que um dos efeitos mais negativos da televisão (e restantes aparelhos eletrónicos)

“é a substituição dos momentos de interação de diálogo e brincadeiras com os pais. Há que não esquecer que a autorregulação, empatia, habilidades sociais e resolução de problemas são principalmente aprendidos através da exploração do ambiente natural, interagindo com colegas e cuidadores e jogando de forma desestruturada e criativa. Em crianças mais pequenas pode substituir atividades sensoriomotoras.”

Dá que pensar, verdade?

Então, o que queremos como líderes para os nossos filhos? (e para nós)

Porque, primeiramente, auscultando e observando os pais com quem me cruzo, os próprios muitas vezes se refugiam na tecnologia para fugir aos comportamentos problemáticos dos filhos. Desta forma, dão menos atenção às crianças, o que pode de facto, pode gerar mais comportamentos desajustados.

A longo prazo, perante este comportamento dos pais, sobretudo, as relações podem ficar comprometidas.

De acordo com outro estudo, este feito nos estados do Illinois e Michigan (EUA), quando os pais passam muito tempo a ver televisão ou nos telemóveis, nomeadamente, durante as refeições ou nos momentos de brincadeira, as crianças tendem a mostrar maior frustração, hiperatividade e comportamentos problemáticos.

Voltando à Sala

Voltando à “minha” sala. Como resultado, eu disse à menina do tablet que tinha sentido que para ela o seu tablet era muito importante e divertido; portanto, peguei nele e tudo, digitei o meu nome e vi-o (vi a sua necessidade). Depois, disse-lhe que a sessão iria começar dentro de 2 minutos e que esta sessão não incluía o uso de tablets.

A menina respondeu que não iria arrumar o tablet porque se estava a divertir. Então, eu disse que iriamos ler uma história e que ela não me iria poder ajudar a lê-la, nem participar da nossa discussão sobre a história, se estivesse no tablet, pois não lhe estaria a prestar atenção (essa seria a consequência natural). Comecei a preparar tudo, ela olhou-me de lado, os colegas aproximaram-se de mim em roda e a menina guardou o tablet e juntou-se a nós.

Em suma, quero acreditar que a conexão, a partilha, o fazer parte do grupo, e a participação (ainda) falaram mais alto 🙂 e sei que as consequências naturais são relevantes para as suas decisões.

Sem comentários

Deixa o teu comentário e /ou ideias para o próximo artigo